Nos primeiros meses do ano, no pico da colheita da safra de grãos, uma cena tem se repetido com bastante frequência. No meio de uma plantação de soja, um grupo atento de produtores ouve as explicações dadas por um pesquisador. Os temas são diversos e abordam desde a lagarta do momento até resultados de longos experimentos. São encontros batizados de “Dias de Campo”, que estão reunindo uma quantidade cada vez maior de produtores.

No mês passado, a DINHEIRO RURAL acompanhou um desses encontros, que duraram dois dias, no município de Nova Mutum (MT), promovidos pela Fundação MT. “Nos dias de campo, em pouco tempo é possível transmitir uma grande quantidade de informações e de técnicas agrícolas”, diz Francisco Soares Neto, presidente da Fundação MT, com sede em Rondonópolis. “Porque não adianta ter uma boa pesquisa, se ela não é divulgada e não se tornar uma realidade ao produtor.” Mas essa é apenas uma parte do trabalho da entidade. Durante todo o ano, a fundação monitora lavouras e promove pesquisas nas áreas de agricultura de precisão, mecanização, sistemas de produção, manejo e nutrição de plantas. “Os pesquisadores também vão a dez cidades, antes do plantio da safra, para auxiliar os produtores”, diz Neto. “Depois, elas são visitadas ao longo da safra para acompanhar o cultivo.”

A Fundação MT, que foi criada e é mantida por produtores, não é um caso isolado no País. Ela já tem bons similares espalhados pelo Brasil. Entre elas estão duas importantes entidades sul-mato-grossenses: a Fundação MS, no município de Maracaju, e a Fundação Chapadão, em Chapadão do Sul, na divisa com o Estado de Goiás. Ambas surgiram nos anos 1990, em busca de pesquisa aplicada para melhorar a eficiência no campo. Não por acaso, nas últimas cinco safras, a produtividade média de grãos, como soja, milho, sorgo, feijão, cresceu 8,7% no Centro-Oeste, passando de 3,7 mil quilos, por hectare, para os atuais 4 mil quilos. A produção nesta safra é estimada em 81,6 milhões de toneladas, 26% acima da safra 2013/2014. No País, há outros tipos de fundações atuando, como a Bill & Melinda Gates, do fundador da Microsoft, Bill Gates, ou a japonesa Mitsubishi Corporation, mas elas atuam com foco assistência técnica rural.

Não é o caso das fundações mantidas por produtores rurais, que buscam o desenvolvimento e a validação de tecnologias. O trabalho da Fundação MT mostra que, desde a sua criação, ela vem contribuindo assiduamente com os resultados de campo. A produtividade em Mato Grosso subiu de 40,8 sacas de soja de 60 quilos por hectare, na safra 1992/1993, para 54,5 sacas no último ciclo. “Quando cheguei em Rondonópolis, em 1982, colhia 38 sacas por hectare”, diz Elusmar Maggi Scheffer, um dos sócios do grupo Bom Futuro, com sede na capital Cuiabá. A Bom Futuro é o maior produtor de soja do País, com 300 mil hectares de área cultivada nesta safra. “Hoje, colhemos até 65 sacas por hectare”, diz Scheffer. Para Celso Moretti, diretor-executivo de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa, em Brasília, as entidades públicas devem se manter próximas dessas fundações porque a repercussão do trabalho desenvolvido por elas pode ir além de suas fronteiras. “Desenvolvemos com a Fundação MT plantas adaptadas para diferentes regiões”, diz Moretti. “Muitas vezes, as fundações financiam pesquisas de interesse não só ao seu Estado, mas aos produtores de todo o Brasil.”

Francisco Soares Neto: para o presidente da Fundação MT, o orçamento ideal seria o dobro do atual (Crédito:Divulgação)

As parcerias também ocorrem com empresas privadas, em especial com as de produtos químicos, equipamentos e tecnologias. Entre elas estão multinacionais como Basf, Dow e Bayer. De acordo com Luciano Muzzi Mendes, presidente da Fundação MS, a entidade nasceu em 1992 justamente pela necessidade de se fazer testes com os produtos lançados no mercado. “Os agricultores precisavam de uma avaliação isenta”, diz Mendes. Para ele, até hoje, a validação de variedades de sementes é o trabalho mais importante da fundação. “Comparamos as variedades recomendadas ao Estado e testamos arduamente”, afirma ele. “Já observamos diferenças de produtividade de até 20 sacas de 60 quilos por hectare, para a soja, e de 30 sacas no caso do milho.” Na safra 1992/1993, o Estado produzia 34,8 sacas de soja por hectare, enquanto que, na safra passada, foi de 56,7 sacas por hectare, em 2,5 milhões de hectares cultivados.

As parcerias são importantes porque, embora sejam entidades privadas, as fundações são cobradas pelos produtores como se fossem entidades públicas. Isso porque as pesquisas, mesmo com orçamentos apertados, não podem parar. A Fundação MS, por exemplo, contou com uma receita de R$ 8 milhões em 2017, o mesmo valor do ano anterior. Já a Fundação MT, mais rica, tem um orçamento de R$ 20 milhões para este ano, valor 17,6% superior a 2017. Mesmo assim, de acordo com Neto, a entidade não consegue crescer na mesma velocidade pela qual é demandada, justamente em função do orçamento. “Precisamos das empresas privadas para ampliar as fontes de recursos”, diz ele. Segundo Neto, a entidade tem uma necessidade atual de pelo menos R$ 40 milhões. “Hoje, os mantenedores cobrem o que falta para fechar o orçamento”. No caso da Fundação MT, o rateio das contas é feito entre os seus 20 associados. Mas ele lembra que de maneira alguma a conta é colocada como caridade. “Foi a visão comercial do grupo fundador da entidade que levou à expansão de sua atuação”, afirma Neto. “E os produtores têm ganhado mais por causa dela.”