Desde o início de 2015, quando o dólar passou a se valorizar frente ao real, criou-se a imagem de que o agronegócio brasileiro entraria em um ciclo dourado de lucros devido à sua grande vocação exportadora. Quando o assunto é suco de laranja, cujas exportações somam 95% de toda a produção, a impressão é que o mercado tenha ficado definitivamente doce. Mas a verdade, infelizmente, não é assim tão açucarada.

Embora seja inegável que a desvalorização do real frente ao dólar seja importante para a competitividade dos produtos brasileiros no exterior, a relação dólar/real é apenas uma das peças desse quebra-cabeça que é o mercado internacional. Em tese, a lógica é simples: com custos de produção cotados em real e a venda realizada em moeda americana, aumenta-se o faturamento das empresas exportadoras na moeda brasileira. No caso específico da cadeia do suco de laranja, porém, há dois fatores bastante importantes e que devem ser observados. O primeiro é que a cadeia de produção tem grande parte de seus custos cotados em dólar, como os equipamentos usados nas fábricas ou mesmo no fretamento marítimo ou terminais no exterior. Verdade seja dita, pode-se até se apropriar de algum ganho em partes pontuais do setor, como arrendamento de terra, mão-de-obra e energia elétrica (caso os aumentos não fossem tão grandes quanto foram). Mas o segundo ponto, e talvez o mais importante, é a relação cambial entre o euro e o  dólar. Isso porque o Brasil vende cerca de 70% do que produz para a União Europeia.

Em 2014, a relação cambial entre os Estados Unidos e a Europa era de 1,35 dólar para 1 euro. Hoje, o valor caiu para cerca de 1,09 dólar para cada 1 euro e este é o problema. Isso porque o suco de laranja é comprado em dólar e vendido no varejo em euro e essa diferença cambial fez com que o suco de laranja brasileiro ficasse mais caro, sem que houvesse qualquer tipo de aumento no valor do preço vendido aos clientes europeus. 


Conta fina:
cadeia tem ganhos pontuais, como na mão de obra, mas maior parte dos custos é em dólar

A equação é a seguinte: US$ 1,8 mil (cotação do suco em 2014, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior, Secex) multiplicado por US$ 1.122 (imposto de importação pago na Europa), o que soma US$ 2.019,60 como preço total. Esse valor, dividido por um câmbio de US$ 1,35 por cada euro, é igual a € 1.496 por tonelada. Agora, fazendo exatamente a mesma conta e alterando a taxa de câmbio para US$ 1,09 por cada euro, o resultado final é de € 1.852,80 a tonelada. No fim das contas, a relação cambial entre Europa e Estados Unidos adicionou um sobrepreço de € 357 por tonelada ao comprador europeu sem que houvesse qualquer aumento de preço no produto.

Não por acaso, segundo ressaltam fontes como a própria Secex, bem como relatórios internacionais como o Juice Market ou FoodNews, observa-se que as cotações cederam nos últimos meses, principalmente desde que essa distorção cambial começou. Segundo essas fontes, a cotação média do suco de laranja tem rodado nos últimos meses em torno de US$ 1,6 mil. Agravando esse cenário, ainda caminhamos para o pico de safra da maçã, maior concorrente do sabor laranja na Europa. Nas gôndolas alemãs, maior mercado consumidor de sucos da Europa, o litro do suco de maçã é vendido a € 0,60, enquanto o suco de laranja tem média de € 0,90.

Não há dúvidas que um câmbio mais equilibrado é fundamental para a indústria exportadora. Mas é preciso ter cautela em relação ao sentimento de que todos os problemas se resolvem a partir da relação dólar/real porque, no fim das contas essa é apenas uma peça da complicada equação chamada mercado internacional de bebidas.