O estagiário de logística Matheus Fonseca, de 21 anos, morador de Campinas, vive uma situação inusitada. Fez uma encomenda de um tabaco importado em uma empresa em São Paulo. De carro, o pacote chegaria à sua casa em algo como duas horas. Mas o produto foi enviado pelos Correios. E Fonseca já espera por ele há mais de um mês.

Pior: segundo ele, o pedido já está no Centro de Distribuição dos Correios em Campinas, que fica muito perto da sua casa. Como é um produto perecível – tem prazo de vencimento de seis meses -, tentou retirá-lo pessoalmente. “Mas eles não me deixaram retirar. Não tive uma explicação muito clara, apenas me informaram que eu precisaria aguardar a entrega em casa.”

O caso de Fonseca é um entre muitos. Na pandemia da covid-19, houve um enorme crescimento de compras online, e os Correios são um elo importante nessa cadeia, os responsáveis por boa parte das entregas. Mas as reclamações em relação a essas entregas têm subido exponencialmente. De acordo com dados do Procon, no Estado de São Paulo, as reclamações por “serviço não fornecido, não entrega ou demora para o recebimento do produto” e também por “serviço mal executado” saltaram de 216 entre março e junho de 2019 para 1.151 em igual período deste ano – um aumento de mais de cinco vezes.

Na avaliação dos Correios, porém, o quadro não é tão dramático. A informação oficial é que há, neste momento, cerca de 1,5 milhão de encomendas em atraso, o que representaria 5% do total a ser entregue. Em meados do mês passado, esse atraso havia chegado a 7%, ou seja, 2,2 milhões de encomendas represadas.

Os maiores problemas estariam localizados nos Estados do Rio, Pará e Amazonas. Em janeiro, antes da chegada da covid-19, “os Correios trabalhavam com o índice de qualidade operacional de 98% de encomendas entregues no prazo”, disse a empresa.

Redução de pessoal. “Esses problemas foram causados, em sua maioria, pela redução de pessoal por medidas de profilaxia, prevenção, ações judiciais e delay na capacitação de mão de obra temporária”, disse ao Estadão o general Floriano Peixoto, presidente da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). “As coisas estão se ajustando. Não queremos expor nossa força de trabalho ao risco de contaminação, enquanto lutamos para manter a qualidade dos serviços”, justificou.

Quando falou em ações judiciais, Peixoto se referia às 84 ações impetradas na Justiça, até agora, por sindicatos pedindo afastamento de pessoal para testagem ou simplesmente o fechamento de centros de distribuição de encomendas por casos de contaminação pela covid-19. Por conta das ações, a empresa diz que já teve cerca de 30 centros de armazenamento e distribuição de encomendas fechados por um período entre sete e dez dias, causando problemas de logística. Hoje, segundo os Correios, nenhum centro de triagem e tratamento está fechado.

Afastamentos

Para os presidentes do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios em São Paulo, Elias Cesário de Brito Júnior, e em Brasília, Amanda Corcina, há muitas encomendas atrasadas não só pelo aumento das vendas do comércio eletrônico na pandemia, mas também pela necessidade de afastamento de grande número de pessoal, por causa da contaminação de empregados em áreas onde estariam faltando equipamentos de proteção individual e com higienização inadequada de instalações.

A direção da ECT contesta a informação e lembra que foram firmados acordos para que o Exército fizesse higienização em pelo menos 12 Estados, entre eles São Paulo, Rio de Janeiro e Pará, e também para que a Cruz Vermelha atuasse na limpeza em Brasília, no Ceará e no Rio Grande do Norte.

Mas, para ex-diretores dos Correios, ouvidos pelo Estadão sob a condição de anonimato, a empresa não teria se preparado adequadamente para encarar os problemas provocados pela covid-19.

Para essas fontes, o principal problema enfrentado pela empresa é na distribuição, e isso poderia ter sido minimizado, por exemplo, se tivessem sido contratados motoristas terceirizados para acompanhar os carteiros – já que esses profissionais não podem ser terceirizados, por questões de confiabilidade nas entregas.

Os Correios têm atualmente 99 mil empregados. Desse total, 18,4 mil encontram-se em trabalho remoto, sendo 5,1 mil da área administrativa. Os empregados da área operacional afastados do local de trabalho (como os carteiros, motoristas e atendentes, dentre outros) somam 13,3 mil, e estão realizando atividades de treinamento remoto por se enquadrarem em grupos considerados de risco para a covid-19 – que são as gestantes e lactantes, pessoas com 60 anos ou mais e pessoas imunodeficientes ou com doenças preexistentes crônicas ou graves.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.