O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, pautou para votação do plenário nesta quarta-feira, 28, a votação do projeto de lei 510, que muda radicalmente as regras sobre regularização fundiária no País. O tema está entre as prioridades do presidente Jair Bolsonaro, é acompanhado com lupa pela bancada do agronegócio e criticado pela ala ambiental.

De autoria do senador Irajá (PSD-TO), a proposta é vista como uma nova versão da extinta MP 910, que ficou conhecida como a MP da Grilagem. Na noite desta terça-feira, 27, o projeto ainda não tinha sequer o seu relatório final divulgado. Pelo regimento, é preciso que apresentem até as 10h de amanhã. Se apresentarem o relatório, os senadores podem apresentar emendas e destaques (sugestões de alteração) até 14h, para que a votação aconteça às 16h, como está previsto.

Informações de quem acompanha de perto o tema dão conta de que já há mais de 40 emendas prontas para serem apresentadas. Organizações ambientais alertam que o PL 510/21 altera a data limite para que invasões de terras públicas sejam legalizadas (passando de 2011 para 2014) e permite que grandes áreas (de até 2500 hectares) possam ser tituladas sem necessidade de vistoria in loco, ou seja, que seja feita de forma remota. “Cientes de que a grilagem de terras públicas é responsável por 1/3 do desmatamento no País, além de ser promotora de uma espiral de violência, seria um absurdo aprovar um projeto como esse”, declaram as organizações ambientais, duas semanas atrás.

“Não há qualquer necessidade de modificação do atual marco legal para que os mais de 100 mil posseiros registrados no Incra possam receber seu título de propriedade. Para aqueles que há décadas ocupam e produzem em terras públicas, a legislação atual já é suficiente”, afirmaram, no documento, as organizações Observatório do Clima, Instituto Socioambiental, WWF Brasil, SOS Mata Atlântica, Instituto Democracia e Sustentabilidade, Greenpeace, Instituto Sociedade, População e Natureza e Instituto de Estudos Socioeconômicos.

Em nota técnica, o Instituto Imazon afirma que o projeto anistia o crime de invasão de terra pública, além daqueles que o praticaram entre o final de 2011 e 2014. A avaliação é de que a proposta incentiva a continuidade de ocupação de terra pública e desmatamento, pois cria direito de preferência na venda por licitação a quem estiver ocupando área pública após dezembro de 2014, sem limite de data de ocupação.

Outro alerta é que cria benefícios a ocupantes de médios e grandes imóveis em terra pública, ao reduzir valores cobrados na titulação de quem já tem outro imóvel, dispensar custas e taxas no cartório e no Incra para médios e grandes imóveis titulados, ampliar prazo de renegociação de titulados inadimplentes e ampliar prazo de renegociação de dívidas do crédito rural até dezembro de 2021.

Outras implicações é que PL, segundo o Imazon, aumenta o risco de titular áreas em conflitos ou com demandas prioritárias, porque elimina a vistoria prévia à regularização e enfraquece os casos excepcionais em que a vistoria é obrigatória. O projeto ainda permite titular áreas desmatadas ilegalmente sem exigir assinatura prévia de instrumento de regularização de passivo ambiental, nos casos em que não houve autuação ambiental.

“Permite reincidência de invasão de terra pública, pois autoriza nova titulação a quem foi beneficiado com a regularização e vendeu a área há mais de dez anos. Assim, reforçará o ciclo vicioso de invasão de terra pública. Também amplia a possibilidade de extinção de projetos de assentamento para aplicação das regras de privatização de terras públicas, com risco de afetar assentamentos criados para populações agroextrativistas”, informa o instituto.

Apoio

O projeto, por outro lado, tem o apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária. “A FPA defende a regularização fundiária como ferramenta de combate ao desmatamento e queimadas ilegais em todo o Brasil”, declarou à reportagem o presidente da FPA, Sérgio Souza (MDB-PR). “Garantir dignidade às famílias que precisam de segurança jurídica e escritura de suas terras para produzir também é um dos benefícios da proposta. Aqueles que tem posse, mansa (sem conflito fundiário ou irregularidade) e pacífica, precisam do direito de poder pagar suas terras e regularizar”, disse.

Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista sênior em políticas públicas da organização Observatório do Clima, afirma que o projeto de lei retoma os retrocessos da MP da Grilagem derrubada em 2020. “Os apoiadores da proposta tentam impor a narrativa falsa de que se preocupam com os pequenos produtores, mas a legislação atual já contempla regras que facilitam regularizar as ocupações de até quatro módulos fiscais. Na verdade, o que querem é beneficiar médios e grandes posseiros, grileiros de terras públicas. Uma lei com esse conteúdo vai incentivar mais ocupações irregulares e mais desmatamentos e outras infrações ambientais”, declarou.