MISSÃO OFICIAL NA SUÉCIA: parte da frota de ônibus de lá roda a etanol

O governo do presidente Lula parece estar adotando uma postura esquizofrênica diante dos biocombustíveis. Para o público externo, o etanol se transformou num instrumento de propaganda e no carro-chefe da diplomacia brasileira. Exemplo disso ocorreu em setembro, na missão oficial à Escandinávia, onde Lula “vendeu” a experiência brasileira na área de combustíveis verdes. A maior concessão foi obtida na Suécia – o governo de Estocolmo se comprometeu a eliminar as barreiras à importação do álcool brasileiro. Internamente, porém, a maior ameaça ao desenvolvimento do etanol vem do próprio governo. É um projeto de lei federal que deixaria a cadeia produtiva do álcool à mercê da Petrobras, instalando uma espécie de monopólio estatal, que já vem sendo chamado de “Alcoolbrás”. De acordo com o texto, elaborado pelo Ministério de Minas e Energia e pela Casa Civil, a Petrobras teria o controle da distribuição de álcool no País. Além disso, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) regularia todo o processo: desde a produção até a importação e exportação de álcool. Para quem entende do setor, é um risco e tanto. “No que diz respeito ao etanol, é necessário saber que esse é outro tipo de combustível, pois implica agricultura antes”, disse à DINHEIRO RURAL o ex-ministro Roberto Rodrigues. “Não há lógica no fato de uma entidade que não tem tradição em agricultura contrololar o setor.”

O alerta do ex-ministro deveria ser levado em conta. Afinal, a mão pesada do Estado pode colocar em risco investimentos bilionários que estão sendo feitos no álcool brasileiro. Nos EUA, o fundo Janus anunciou a compra de uma participação na Cosan, maior empresa de etanol do País. A Brenco, que tem como investidores nomes como Bill Clinton, ex-presidente americano, e Steve Case, fundador da America Online, também adquiriu usinas que pertenciam à Dedini. E, na Europa, um ex-diretor da Enron, Diomedes Christodoulou, já capta recursos para um fundo de US$ 150 milhões que investirá em etanol de canade- açúcar no Brasil. Os dólares estão vindo na crença de que as regras de mercado serão mantidas. Em nota à imprensa, a Unica, entidade que reúne os usineiros, salientou que o setor está num círculo virtuoso e que o livre mercado tem funcionado bem, apesar da volatilidade dos preços.

Enquanto não chega ao Congresso, o embate sobre o projeto continua. José Vicente Ferraz, diretor do Instituto Agra FNP, relembra que o País já teve experiências desastrosas de tentativas do Estado de regular um determinado segmento, como o caso do Instituto Brasileiro do Café (IBC). Para Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), do jeito que está, o projeto deixa nas entrelinhas a intenção do governo de dar mais poder à Pebrobras, quase recriando o extinto Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA).

A ENERGIA QUE VEM DA CANA

Geração a partir do bagaço é alternativa viável e barata

QUEIMA DO BAGAÇO EM SP: potencial estimado em 10 mil MW

Se o governo estiver mesmo disposto a dinamizar o setor sucroalcooleiro no País, uma grande oportunidade é a chamada bioeletricidade. Em outras palavras, trata-se de estimular a geração de energia a partir da queima do bagaço da cana-de-açúcar, que é um subproduto da produção de etanol. Com isso, seria possível não apenas diversificar a matriz energética como ainda fomentar a indústria nacional, uma vez que a grande maioria das caldeiras e geradores é produzida no Brasil, no pólo industrial de Sertãozinho, no interior de São Paulo. No mês passado, durante o encontro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com representantes da União Nacional da Indústria Canavieira, a Unica, foi apresentado um estudo técnico apontando a c a p a c i d a d e atual de geração, que é de 1.448 megawatts médios. Isso equivale ao volume previsto para a usina de Angra 3, que foi autorizada pelo governo neste ano. Além disso, em função do prognóstico de aumento da área plantada de cana, o setor prevê a geração de 10 mil megawatts médios para a safra 2012/2013. É mais do que o projeto do rio Madeira, em plena Amazônia, que demandará investimentos da ordem de R$ 30 bilhões. No caso da geração a partir do bagaço, os custos seriam muito menores, sem falar no benefício ambiental e na proximidade entre as usinas e os pólos consumidores. Em função desses benefícios, a Unica reivindica que o governo federal estabeleça um preço justo e crie ramais para as usinas jogarem a bioeletricidade nas redes de transmissão das distribuidoras de energia. Outra solicitação é da racionalização das licenças ambientais necessárias para os empresários que participarem dos leilões de energia. É muito pouco diante das vantagens da “energia verde” da cana.