Arnaldo Jardim, secretário da Agricultura de São Paulo, diz que o impeachment pode trazer boas perspectivas ao setor

Osecretário de Estado da Agricultura e Abastecimento de São Paulo Arnaldo Jardim, deputado federal pelo PSDB, é muito falante e extrovertido. Para ele, anunciar aos quatro ventos as potencialidades do agronegócio paulista é muito mais do que um ofício, é uma missão. A diversificada e complexa economia paulista, que é uma grande fornecedora de bens de consumo, de capital e de serviços para as demais regiões do País, tem mostrado que o agronegócio passa por um refinamento, diz ele. Sai a produção em larga escala  e entra a produção de valor, por meio da tecnologia, da pesquisa e da inteligência. “É a partir do Estado que a cadeia de insumos organiza suas estratégias de trabalho”, diz Jardim. Em entrevista à DINHEIRO RURAL, o secretário falou da necessidade de investimentos na agroindústria, em assistência ao produtor e também dos desafios de crescimento de um setor que, em 2105, teve um Valor Bruto da Produção de R$ 61,5 bilhões, o segundo maior do País. Jardim também falou sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, que tramitava no Senado no fechamento desta edição, no final de abril. Confira os principais trechos da conversa.

dinheiro RURAL – Com um cenário de impeachment dado como certo, qual será o impacto para o agronegócio da mudança de presidente?
ARNALDO JARDIM  –
A expectativa do setor é positiva. Há uma alegria unânime entre todos os representantes do agronegócio, por que essa mudança de governo pode trazer novas e boas perspectivas. Estamos vindo de um ano em que era notória a indisposição entre governo e produtores, tanto que a ministra Kátia Abreu ficou bastante isolada e a antecipação do Plano Safra 2016/2017 foi vista como uma tentativa de mostrar serviço e chamar a atenção.

RURAL – E essa expectativa positiva se estende ao governo Michel Temer?
JARDIM  –
Sim. Já estão sendo sondados nomes para os Ministérios e o que estamos pedindo para o agronegócio é que a escolha não seja apenas por critérios políticos. O setor não tem uma boa aceitação de representações que tenham apenas o conhecimento político. É fundamental que seja alguém com vivência da agropecuária, bom relacionamento com as entidades setoriais e conhecimento do campo.

RURAL – Essas exigências estão sendo pontuadas nas conversas recentes com o vice-presidente?
JARDIM  –
O Temer tem se mostrado aberto a receber sugestões e conversar com os representantes do setor, o que é importante para nós, pois temos a possibilidade de apresentar exatamente o que necessitamos e orientar como os próximos passos poderão ser seguidos. Sem dúvida, ele terá uma agenda positiva para trabalhar nos próximos anos e acredito, realmente, que temos um bom percurso para o futuro.

RURAL – Qual o papel de São Paulo no agronegócio brasileiro, desde que o Centro-Oeste passou a ser o principal ator da produção agropecuária nacional?
JARDIM  –
São Paulo realmente não tem mais o perfil das grandes áreas produtivas, embora o Estado seja o segundo em produção agrícola, no que se refere a valores. Somos uma potência agrícola, com um Valor Bruto da Produção de R$ 61,5 bilhões. Perdemos apenas para o Estado de Mato Grosso. São Paulo passou a ser o de centro da inteligência, das decisões e das negociações do agronegócio nacional. É a partir do Estado que a cadeia de insumos organiza suas estratégias de trabalho, que acontecem as negociações de produção e de onde muitos empresários rurais fazem o gerenciamento de suas propriedades.


Retrato do poder: o vice-presidente Michel Temer recebeu apoio dos empresários e Kátia Abreu ficou isolada

RURAL – Quais são os investidores interessados nesse potencial paulista?
JARDIM –
Todo o mundo olha para nós porque São Paulo oferece a sensação de estabilidade no agronegócio. Um exemplo é o banco agrícola americano CoBank, interessado em investir no Estado. Na conversa que o governador Geraldo Alckmin e eu tivemos com Thomas Halverson, diretor financeiro da instituição, deixamos claro que toda a área de agropecuária, com a qual ele se encantou, ocupa menos de 10% da área do País. No cenário internacional, isso significa que temos espaço para crescer, sem comprometer a Amazônia. Neste momento, o CoBank está apenas esperando que as disputas políticas que ocorrem no País se acalmem para iniciar as negociações.

RURAL – Como o governo pode atuar em um ambiente econômico paralisado, no qual os contingenciamentos de recursos têm sido severos?
JARDIM –
Nossos recursos foram reduzidos em até 30% para todos os contratos, de verbas para custeio a investimentos em laboratórios, o que significa deixar de gastar R$ 40 milhões neste ano. Mas, dentro do orçamento de R$ 1,1 bilhão para o setor, alguns programas ficaram a salvo, como o Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável Microbacias (Microbacias II), iniciado em 2010, e o Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (Feap/Banagro). Com eles, conseguimos manter o processo de desenvolvimento de cadeias, entre elas as da pecuária de leite, da borracha natural e da fruticultura, por exemplo. Essas atividades são importantes para a produção paulista porque geram acúmulo de conhecimento, possuem alta capacidade produtiva e necessitam de mão de obra mais refinada.

RURAL – Nesse contexto, qual a principal pauta para o agronegócio do Estado?
JARDIM  –
Para o setor, é importante a isenção dos impostos na comercialização de produtos agrícolas, no caso o Pis/Cofins. Existe a possibilidade de as empresas abaterem os impostos, desde que os valores sejam revertidos para programas como, por exemplo, o Leite Sustentável, criado
pelo Ministério da Agricultura (Mapa), para o melhoramento da bacia leiteira. Fizemos um acordo com o ministério para que ele liberasse a ação e estamos pedindo a autorização dos programas para creditar os valores arrecadados com a isenção.

RURAL – Há pautas comuns entre todos Estados? 
JARDIM –
Sim. Além do Plano Safra e do Seguro Rural, um tema que une todos os secretários é a contribuicão para fortalecer os pilares do Programa de Modernização da Frota de Tratores Agrícolas, Colhedeiras e Implementos, o Moderfrota, que hoje tem um modelo de negócio exaurido. Também pedimos remanejamento de recursos para o Moderfrota, pois outros programas têm pouca demanda e o investimento em maquinário está em queda, prejudicando o desenvolvimento do agronegócio.

RURAL – Há alguma pauta comum na pecuária?  
JARDIM –
Sim, a mudança no Sistema de Vigilância de Inspeção Agropecuária para os produtos exportados e para o consumo interno. A proposta do Mapa era ter um sistema menos presencial e sistemático, seguindo o modelo de parcerias que já ocorre em Santa Catarina. Lá, as indústrias contribuem para um fundo que contrata empresas para fazer a inspeção. Aos fiscais do Mapa ficaria a incumbência de auditar a inspeção.

RURAL – Qual a posição de São Paulo sobre esse plano?
JARDIM –
Somos a favor do processo de transferência de responsabilidade porque, assim, os fiscais teriam condições de serem mais rigorosos na auditoria. Mais do que uma questão filosófica sobre o papel do Estado, o plano traz praticidade ao setor. O Mapa e os Estados não têm funcionários suficientes para cuidar de tudo. É preciso que o Estado deixe de ser provedor para ser regulador. O projeto ficou parado no final do ano passado, em função de uma greve de fiscais, mas esperamos que o tema volte à pauta ainda neste ano devido a sua importância.


Nova inspeção: a proposta é um modelo de gestão no qual o trabalho terceirizado seria auditado pelos fiscais do Mapa

RURAL – Qual o futuro do agronegócio paulista, em vista de sua diversidade?
JARDIM –
O Estado pode agregar muito valor ao produto agropecuário e o caminho é esse. Não somos pequenos. São Paulo cultiva apenas 16% do café do País, mas processa 60% da torrefação. Detém 5% do rebanho bovino de corte, mas abate 24% dos animais. Possui a maior indústria de açúcar e etanol do País, é o maior produtor de ovos, de laranja e de suco de laranja, além de ter uma participação importante na borracha e em produtos florestais. Nas exportações do setor, a receita de US$ 15,9 bilhões representou 18% do total brasileiro, com destaque em cinco cadeias: o complexo sucroenergético, carnes, sucos, produtos florestais e o complexo soja.

RURAL – Mas há percalços, como no setor da cana…
JARDIM –
De fato. A tendência para a cana é manter a sua importância estratégica, mas diminuir relativamente a área utilizada. O fim da queimada na colheita, que ocorreu definitivamente em 2014, mudou a dinâmi-ca da produção. As regiões de declive terão de mudar para outras culturas. Isso significa redefinir a vocação agrícola de cerca de 600 mil hectares. Estamos oferecendo alternativas para os produtores ocuparem essas áreas, por exemplo, com gado, seringueira ou frutas. O Microbacias II financia até 70% dos projetos de pequenos produtores e agricultores familiares, para valores que chegam a R$ 800 mil. O Feap/Banagro financia o restante para as pequenas agroindústrias.