Debaixo de um pé de cedro, nas barrancas do rio Negro, em Aquidauana, município do Pantanal sul-mato-grossense, Almir Eduardo Melke Sater, ou simplesmente, Almir Sater, um dos violeiros mais famosos do País, encontrou seu canto predileto para compor canções. A mata nativa e a fauna pantaneira têm servido de inspiração para composições famosas, como “Peão” e “Tocando em frente”, ambas do início dos anos 1990, época em que ele trocou a vida na capital Campo Grande pela fazenda Campo Novo, para que também pudesse pescar e criar gado. “Nunca fui de mexer com animal, não era meu negócio”, diz Sater. “Mas, aos poucos, a gente começa a pegar amor pela criação”. De lá para cá, não só outras melodias foram compostas no Pantanal, como o músico também se tornou um pecuarista de primeira linha. Hoje, com três fazendas que somam cerca de cinco mil hectares na região, o cantor possui dois mil bovinos para o abate, além de um núcleo de melhoramento genético.

O próximo passo de Sater, planejado para dois anos, é justamente investir em um projeto de melhoramento genético para formar um rebanho de gado senangus. Esse bovino é o resultado do cruzamento de animais angus, de origem britânica, com o senepol, originado da cruza das raças senegalesa n’dama com a inglesa red poll, ambas de sangue taurino, como o angus. “Quero ter um rebanho desse tipo de animal porque acredito que eles vão se adaptar bem ao Pantanal”, diz. Sater começou a se interessar pelo senangus há cerca de sete anos, a partir de conversas com produtores da região. Pela internet, iniciou sua busca por criatórios, descobrindo alguns na Flórida, nos Estados Unidos. “Vi também que há criadores de senangus na Austrália e na Argentina. Isso me fez interessar mais pelo gado”, diz Sater.

Para o zootecnista Cristiano Leal, gerente de Corte Taurinos da Central de Inseminação CRV Lagoa, uma das maiores empresas de venda de sêmen bovino no País, o passo é ousado. Há cerca de uma década, algumas centrais chegaram a oferecer ao mercado material genético da raça, mas não houve demanda. “Teoricamente, um animal senangus pode transmitir aos seus filhos a qualidade da carne de angus e a adaptação do senepol ao clima quente”, diz Leal. “Além disso, pode garantir um touro de genética europeia que trabalhe a campo no Centro-Oeste”.

É justamente esse o objetivo de Sater: produzir carne a partir do cruzamento de animais de sangue europeu que sejam rústicos. O senangus não é a sua primeira tentativa. Ele já fez uma experiência nos anos 2000, acasalando 200 fêmeas aneloradas com sêmen de angus, do total de 600 fêmeas. “As vacas que nascem desse cruzamento são excepcionais e a carne é de qualidade superior”, diz. “Mas o touro angus não suporta o clima do Pantanal para cruzar com a vacada nelore e eu não quero fazer inseminação em larga escala. Por isso, desisti do cruzamento”.

Agora, Sater acredita que achou a solução. Para formar o senangus, em 2008 ele começou a investir no senepol, gado rústico que aguenta o calor da região. “Conheci a raça numa feira de gado em São Paulo”, diz. “E logo me convenci de suas qualidades”. Sater formou nos últimos anos um rebanho de 40 touros e 20 fêmeas senepol. Os touros são para uso próprio e para vender a outros pecuaristas, e as fêmeas são para o melhoramento. No ano passado, contando os animais gerados através de fertilização in vitro (FIV), nasceram os primeiros 200 bezerros e bezerras senepol. No futuro, o projeto é emprenhar essas bezerras através de FIV, com sêmen de angus e selecionar os melhores machos. “Meu esforço é fazer essa genética com um fim bem prático: produzir carne de qualidade”, diz Sater. Ele acredita que um touro com sangue 100% taurino garantirá a qualidade de carne equivalente à das cruzas do angus com o nelore.

O criador Gilmar Goudard, dono da Estância Goudard, em Uberlândia (MG), e presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Bovinos Senepol, acredita que o projeto de Sater tem tudo para dar certo.  “É uma ideia que pode vingar no País”, diz Goudard. “O senepol pode influir positivamente na formação do senangus, por conta de suas qualidades também em ganhos de produtividade”. Para ele, não seria apenas o angus que contribuiria para uma carcaça bovina mais rentável ao pecuarista. Num teste realizado no ano passado, os animais ganharam, em média, 1,55 quilo de peso por dia, sendo que o esperado era um quilo. “Isso demonstra que o senepol é uma ferramenta certa para o cruzamento com o angus, em qualquer modelo de criação”, diz Goudard.