Em abril, as máquinas estavam a todo vapor para colher 80 hectares de amendoim no entorno de Campo Grande. O trabalho das colhedoras chamava a atenção porque Mato Grosso do Sul não tem nenhuma tradição no cultivo dessa leguminosa.

“Estamos usando o amendoim para uma experiência que pode trazer um novo modelo de negócio no campo”, diz o administrador Everton Regatieri, 44 anos, sócio da Fértille Florestal, de Campo Grande, grupo especializado em implantação e gestão de florestas. Junto com o sócio, o engenheiro florestal Carlos Anastácio Júnior, ele criou o Floresta Mais Integra, um projeto destinado à integração econômica de florestas plantadas de mogno africano com outras culturas. No caso, para ajudar na composição da renda, enquanto as árvores estão em crescimento, foram escolhidos o amendoim e o urucum, utilizado como corante natural pelas indústrias farmacêutica e alimentícia.

O amendoim e o urucum estão sendo cultivados em consórcio. Em julho, será a vez da primeira colheita de urucum, em 400 hectares. O mogno ocupa 1,2 mil hectares plantados em uma área separada. O cultivo da árvore começou em 2013, um ano depois da criação do grupo. A espécie é uma das madeiras mais disputadas por indústrias de móveis no Brasil e no exterior. “Quando o mogno for cortado esperamos um bom lucro”, afirma Regatieri. “O problema é o longo tempo para se colocar a mão nesse dinheiro.” O tempo total, com um corte aos oito anos e outro aos 15 anos, pode render até R$ 480 mil, tomando como medida o preço atual da madeira e a produção de até 150 metros cúbicos de madeira serrada.

O amendoim e o urucum vão justamente garantir uma renda anual, em um arranjo produtivo juntando culturas de ciclo de longo, de médio e de curto prazo. “A perspectiva de rentabilidade é excelente com as duas culturas que foram agregadas ao mogno”, diz Regatieri. “O objetivo é ter uma renda a cada seis meses.” A expectativa é de uma receita anual de R$ 4,7 mil, por hectare, com o amendoim e de R$ 8,9 mil, por hectare, com o urucum.

Na próxima safra, a meta é cultivar 280 hectares de amendoim. A Satra, corretora internacional de grãos, é uma das empresas interessadas em comprar a produção da Fértille. Segundo Cleber Rocha, diretor comercial da empresa, mercados exigentes do bloco europeu, como Holanda, Alemanha e Inglaterra, têm demanda por amendoim de alta qualidade. “O Brasil está justamente conquistando o mercado de amendoim de alta qualidade”, afirma Rocha. “Há espaço para novos produtores.” Com a cultura quase toda no Estado de São Paulo, na safra 2016/2017, o País colheu 499,6 mil toneladas de amendoim, um aumento de 7,2% em relação ao ciclo anterior.

Everton Regatieri: a meta do empresário é ter receita com algum cultivo a cada seis meses (Crédito:Divulgação)

O projeto da Fértille envolve parcerias. A empresa foi criada em 2010 para plantar, administrar e vender a colheita em áreas próprias e arrendadas. A Fértille vende cotas a partir de um hectare de lavoura. O negócio tem despertado o interesse de profissionais liberais e empresários da região. “Fazemos tudo o que os investidores não podem ou não sabem fazer”, afirma Regatieri. Até agora, o projeto Floresta Mais Integra recebeu um aporte de R$ 20 milhões, sendo 30% do grupo e 70% de 300 clientes no Brasil e também em outros países, como Espanha, Canadá e Estados Unidos. Entre eles está o enfermeiro Evandro de Souza Ramos, 36 anos, funcionário da Unimed de Campo Grande. Desde 2016, ele já investiu R$ 150 mil em cinco hectares de mogno, 20 hectares de urucum e em 15 hectares de amendoim. “O investimento em mogno, de longo prazo, é para pagar a faculdade dos meus filhos e para a aposentadoria”, diz Ramos. “Com o urucum e o amendoim, a aposta é em produtos com demanda e com qualidade.”

Ramos está no caminho certo. O Brasil é o maior produtor mundial de urucum, com 11 mil toneladas de sementes, o equivalente a 39% da produção mundial. Mas isso não é quase nada se comparado ao conjunto de corantes naturais, um mercado global que movimenta cerca de US$ 1,3 bilhão por safra, com crescimento médio anual de 5%. Além do urucum, estão na lista a páprica e a cúrcuma, por exemplo. No caso do urucum, a demanda vem da Europa, da China e, principalmente, do mercado interno, que consome dez mil toneladas por ano.

Na Fértille, a expectativa é colher 400 toneladas de sementes de urucum por ano, a partir de 2019. O preço da tonelada é de
R$ 4 mil ao produtor, ante R$ 1 mil no início dos anos 2000. A Verto Industrial, do município de Cabixi (RO), processa 1,2 mil toneladas de sementes de urucum para a produção de pasta e corantes e está interessada na produção da Fértille. “Há demanda de aditivos para as grandes indústrias de alimentos do País”, afirma Claudio Rocha, gerente agrícola da empresa. “Estamos negociando com o grupo Fértille.”