Foi durante uma live promovida pelo movimento Juntos Transformamos, iniciativa da XP Investimentos, que o americano Chris Gardner definiu como a pandemia afeta as pessoas e os negócios de formas diferentes. “Tenho ouvido muita gente dizer que a Covid-19 colocou todos no mesmo barco. Não é verdade. Estamos na mesma tempestade, mas em barcos diferentes”, afirmou o autor do best-seller “À procura da felicidade”, sucesso também no cinema em uma adaptação estrelada por Will Smith. Para os brasileiros que produzem e exportam suínos, essa tempestade se soma a outra que castiga os competidores internacionais desde o ano passado e atende por Peste Suína Africana (PSA). Se fosse um barco, a produção brasileira estaria navegando por estes mares como em um oceano azul, de águas calmas, e em direção a um porto seguro. Os números confirmam. As 102,4 mil toneladas exportadas em maio representam 52,2% a mais do que o volume embarcado no mesmo período de 2019 (67,2 mil toneladas). Em receita, os US$ 227,9 milhões registrados representam alta de 58,4% em igual comparação (US$ 143,8 milhões). Os dados são da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). As duas tempestades que se somaram para produzir esse resultado têm forças para manter a vantagem competitiva dos suínos com marca Brasil por três anos. Mas, para preservar a saúde da balança comercial brasileira no longo prazo a diversificação de mercados compradores e o controle do contágio pelo COVID-19 pelos trabalhadores de frigoríficos são imprescindíveis.

“Queremos fazer uma campanha para aumentar o consumo no País, que no ano passado chegou a 15 quilogramas per capita. O principal cliente do Brasil é o brasileiro” Ricardo Santin, diretor-executivo da ABPA (Crédito:EDI PEREIRA)

O alastramento da pandemia do Covid-19 e da PSA no continente asiático foram os motivos principais para que a demanda das exportações da proteína aumentassem — sobretudo com pedidos vindos da China. “A pandemia apenas retardou algo que já prevíamos 2019. No ano passado, a PSA foi muito severa na China e em outros países da Ásia, onde houve o abate antecipado de cerca de 200 milhões de animais para a doença não se espalhar”, afirma Ricardo Santin, diretor-executivo da ABPA. “Com a falta do produto no mercado interno, o caminho seria comprar no exterior”. Para felicidade dos brasileiros, foi o que ocorreu.

O continente asiático lidera a importação da carne suína brasileira com larga vantagem, respondendo por mais de 80% do total destinado à exportação. A China, país que tem a carne suína como a segunda principal fonte de proteína animal (a primeira são os frutos do mar) abocanha sozinha 58% do volume que o Brasil envia para os portos. Seguem no ranking Hong Kong, com 13%; Cingapura, com 6,4%; Japão, com 2,2% e Vietnã, com 1,7%, segundo dados disponibilizados pelo ComexStat, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDCI). “Nós vemos pelo menos três anos exportações intensas para a Ásia”, diz Santin. Assim como ele, outros analistas são unânimes em prever que esse é o tempo mínimo necessário para que a China recomponha o seu plantel interno e volte a reduzir as importações.

“Temos três grandes potenciais players importadores que são o Japão, Coreia do Sul e México. Para atendê-lo isso é necessário habilitar cada vez mais plantas” Marcelo Lopes, presidente da ABCS (Crédito:Divulgação)

A dependência do consumidor chinês é um dos entraves para que os brasileiros tenham mais portos para onde exportar. Conquistar novos mercados é um dos grandes desafios do setor. “Nós temos mais três grandes potenciais importadores que são o Japão, Coreia do Sul e México”, diz o presidente da Associação Brasileira de Criadores Suínos (ABCS), Marcelo Lopes “Precisamos aumentar a participação brasileira na balança comercial deles, para isso é necessário habilitar cada vez mais plantas”. Recentemente, a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, anunciou a habilitação de mais um frigorífico brasileiro de suínos para vendas ao Vietnã. A notícia animou o setor. “Alternativas positivas para os frigoríficos refletem na expectativa de aumento de receita, pois diante de qualquer briga comercial há alternativas para o produtor”, diz Santin. “Estamos procurando abertura na Índia e México. Pretendemos estar no Canadá, além da Europa assim que for implementado o acordo Mercosul”.

DESTINO Mais de 80% das exportações brasileiras seguem para Ásia. 58%, para China. (Crédito:chayakorn lotongkum)

Como uma das maiores exportadoras de proteína animal do país, a BRF aproveita esse bom momento para melhorar seus resultados. “Quando comparamos o primeiro trimestre de 2020 com o mesmo período do ano passado, registramos forte crescimento de cerca de 7%, ultrapassando a marca de 450 mil toneladas exportadas do Brasil”, diz Leonardo Dall’Orto, vice-presidente de Planejamento Integrado e Supply da companhia. O maior gargalo, para ele, é a falta de infraestrutura logística. “Temos o grande desafio de lidar com os recorrentes atrasos dos navios. Graças à demanda aquecida, não estamos perdendo vendas”, afirma.

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No fim de junho, porém um revés para o setor. O crescimento no número trabalhadores contaminados pelo Covid-19 fez a China suspender a licença de frigoríficos da JBS, Agra, Marfrig e Minuano. Diante da medida, o Governo Brasileiro recorreu a diplomacia e iniciou as negociações na tentativa de resolver o imbróglio.

MERCADO INTERNO

O contratempo preocupa muito, mas para algum alento dos criadores é importante lembrar que o mercado interno ainda é o maior consumidor da proteína. Os brasileiros compram 82% do total da produção. Se depender dos planos da ABPA, o consumo interno deverá crescer para outro patamar. “Queremos fazer uma campanha para aumentar o consumo no País, que em 2019 chegou a 15 quilogramas per capita. Para este ano, tenho certeza de que o volume vai aumentar. O principal cliente do Brasil é o brasileiro”.