Era um domingo à tarde, dia 7 de março, quando a senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), se preparava para viajar a Salvador. A mala de viagem era grande, uma vez que durante toda a semana seguinte ela percorreria o Brasil conversando com produtores e ouvindo propostas que serão entregues aos candidatos à Presidência da República. Na Bahia, Kátia permaneceu até o dia 9, quando viajou para o seu Estado natal, Tocantins, para mais encontros com produtores até o dia 10.

Entre os dias 11 e 12, visitou Minas Gerais, de onde partiu para Curitiba logo na sequência. “Precisamos nos fazer ouvir. O campo brasileiro tem contribuído com o País, por isso nada mais justo que o País também contribua com o campo”, explica. Mais que ouvir propostas e catalisar um plano, o objetivo da presidente da CNA é muito maior: demonstrar a força do campo aos futuros presidenciáveis. A CNA abriga 27 federações agrícolas em sua estrutura. As federações por sua vez abrigam 2.151 sindicatos com mais 1.127 bases estendidas, ou “regiões agregadas”.

Ao todo, são mais um milhão de unidades produtoras cadastradas, o que nas contas da senadora dá um contingente muito maior de votos ao se levar em conta familiares e trabalhadores. “São milhões de pessoas que vivem e trabalham no campo e que têm o direito de propor a sua agenda para o Brasil”, pondera. “O campo tem uma força de voto ainda desconhecida e a nossa intenção é mostrar isso aos candidatos”, explica.

Um dos idealizadores do projeto é o ex-ministro da Previdência Social Roberto Brant, que acredita num resultado positivo. “A importância econômica do campo não é proporcional à atenção que ele recebe das autoridades”, explica ele, que é um dos deputados da bancada ruralista. Brant diz que, por causa das diferenças regionais que há no País, muitas propostas foram apresentadas visando resolver questões locais.

Contudo, existe uma agenda global cujos pontos são comuns a todos os produtores. “A questão ambiental foi muito discutida e todos nós concordamos com o crescimento sustentável, mas não vamos aceitar nenhum tipo de discussão ideológica”, avalia.

A própria presidente da CNA comemora o fato de que um grupo de trabalho liderado pela Embrapa fará a primeira grande análise do meio ambiente brasileiro, que servirá de base para discussões futuras. “Não temos que ter medo do que diz a ciência, mas não vamos deixar que os debates sejam contaminados por meias-verdades”, avalia.

Ideal: Roberto Brant, um dos idealizadores do projeto, diz que o campo precisa ter uma agenda própria

Outro ponto presente nas discussões é o direito à propriedade, algo extremamente relativizado no campo. “Quem invade uma casa ou um prédio vai preso, mas quem invade e depreda uma fazenda, não”, desabafa o presidente da Federação Agrícola do Paraná, Ágide Meneguette. Da mesma opinião comunga o representante gaúcho Carlos Rivaci Sperotto. “Não é possível que essa insegurança jurídica continue e esse é um ponto que precisamos levar aos candidatos. Afinal, um deles será o próximo presidente”, simplifica.

2.151 sindicatos rurais congregam mais de 1 milhão de produtores em todo o brasil

Fator de preocupação para os produtores é a forma como a biotecnologia e a utilização de organismos geneticamente modificados tem sido tratada. “Essa é uma decisão técnica, que não pode ser tratada com viés ideológico. Por isso é preciso que os departamentos técnicos tenham respaldo em suas decisões”, condensa o presidente da Federação Agrícola de Mato Grosso, Rui Prado. “Ficamos anos e anos atrasados e agora que as coisas estão andando é fundamental que não aconteçam ingerências políticas”, avalia.

Também será motivo de avaliação para o futuro – ou futura – presidente a transferência de obrigações do Estado para os empresários rurais. “As pessoas em São Paulo podem passar horas presas no trânsito, passar por alagamentos, ônibus lotados e toda condição degradante que ninguém fala nada”, afirma Brant. “Mas os produtores são obrigados a realizar todo o transporte dos trabalhadores sem nenhum tipo de ajuda do Estado e, se qualquer coisa der errado, pagamos caro por isso”, define.

Na análise do ex-ministro da Previdência, o campo paga caro por não possuir a mesma capacidade de mobilização que os centros urbanos. Ele compara, por exemplo, com o lobby dos produtores agrícolas no Congresso americano. “Eles possuem uma influência superior à sua importância econômica, porque eles também carregam aspectos culturais, como a fixação do homem nas regiões rurais, assim como o fato de produzirem os alimentos que a nação consome”, diz. “Tudo isso está precificado na influência que chega aos congressistas.” O que espera a senadora com essas propostas? “O agronegócio tem voz e queremos que ela seja ouvida”, define.