Todo pecuarista que engorda bois no pasto e que deseja aperfeiçoar a gestão de seu negócio deve aumentar a produção de carne por hectare e, assim, melhorar a rentabilidade da fazenda, dizem os manuais do agronegócio. Mas como trilhar esse caminho perseguido por dez entre dez empresários do setor? Muitos deles respondem de bate-pronto: basta ter bons pastos e colocar mais animais na fazenda. Na busca por maior produtividade, aumentar a taxa de lotação por hectare faz todo o sentido, mas não é a única forma de intensificar a pecuária. Num sistema moderno de produção de carne, no qual o pecuarista deve melhorar a eficiência de cada animal vendido ao frigorífico, é preciso estar atento ao chamado rendimento de carcaça, que é a relação entre o peso vivo do animal a ser abatido e o peso da carcaça, expresso em porcentagem. É esse parâmetro que efetivamente traz receita, pois mensura as partes remuneradas pela indústria frigorífica, composta pelas meias carcaças após a limpeza, desprovidas de cabeça, patas, couro, vísceras e rabo.

Em Mato Grosso Sul, os 320 pecuaristas da Associação Sul-Mato-Grossense de Produtores de Novilho Precoce (ASPNP), com sede em Campo Grande, têm mostrado bons resultados no rendimento de carcaça dos animais enviados aos frigoríficos. “Em alguns casos, o rendimento chegou a até 55%”, diz o veterinário Klauss Machareth de Souza, diretor-executivo da entidade. Desde 2005, a ASPNP está medindo o rendimento de todos os animais destinados aos frigoríficos. No ano passado, foram abatidos 151 mil bovinos.

“Orientamos os produtores sobre qual sistema melhor se encaixa para a engorda de seus animais”, diz Souza. Segundo ele, com orientação técnica, o rendimento de carcaça das fêmeas abatidas passou de 48% para 51%. Nos machos, subiu de 52% para 53,5%.

Para ilustrar o impacto da melhora da produtividade no bolso do pecuarista, o agrônomo Rodrigo Paniago, especialista em produção de ruminantes da Consultoria Boviplan, de Piracicaba (SP), propõe o seguinte exercício: um boi de 480 quilos, com rendimento de 50% de carcaça após o abate, resulta em 240 quilos de carne com osso, equivalente a 16 arrobas. Com a arroba de boi gordo cotada a R$ 105, por exemplo, isso representa ao pecuarista uma remuneração de R$ 1,6 mil por animal, ou por hectare, caso seja essa a lotação da fazenda. De acordo com o consultor, para cada ponto percentual a mais no rendimento de carcaça, considerando essa mesma cotação do boi gordo, o pecuarista alcançará um ganho extra de R$ 33,60 por cabeça. “Pelo mesmo raciocínio, aumentar o rendimento de carcaça de 50% para 55% significa faturar R$ 168 a mais por animal”, diz Paniago. E se a melhora na produção de carne, por animal, vier acompanhada pelo aumento na taxa de lotação da fazenda, os ganhos serão ainda maiores por área.

Por exemplo, uma lotação de 0,7 cabeça por hectare – índice considerado como média nacional –, com rendimento de carcaça de 50%, produz uma receita de R$ 1,1 mil. Caso melhore a condição da pastagem e eleve a lotação para 1,4 cabeça por hectare (longe ainda de ser considerda elevada) e consiga abater a boiada com rendimento médio de carcaça de 55%, a renda do pecuarista saltará para R$ 2,5 mil. “Isso representa um aumento de R$ 1.411 por hectare”, afirma Paniago.

Na fazenda Califórnia, em Água boa (MT), que pertence ao grupo bandeirantes, que também atua na área de empreendimentos imobiliários e de engenharia em saneamento, ferrovias e rodovias, apostar na genética do rebanho vem garantindo pontos valiosos no rendimento por carcaça. A propriedade, dirigida pelos irmãos Abel e João Leopoldino, mantém um rebanho de 20 mil fêmeas em reprodução, entre nelores puras ou cruzadas com angus, que são inseminadas todos os anos com sêmen de touros americanos angus, desde que apresentem o chamado índice “$Rend”.  O índice é uma ferramenta de seleção genética que prediz o desempenho dos futuros filhos desses acasalamentos, através das Diferenças Esperadas nas Progênies (DEPs). “O $Rende aponta o maior lucro esperado em função do maior ganho em carcaça dos filhos das 20 mil fêmeas do rebanho”, diz o veterinário Gustavo Pires Ribeiro, da Correta Consultoria Agropecuária, que presta assessoria à Califórnia. Nos últimos dez anos, a fazenda conseguiu um incremento de 5% nos valores de rendimento de carcaça. “Atualmente, abatemos machos superprecoces com 56% de rendimento e fêmeas com 54%”, diz Ribeiro. A fazenda Califórnia envia aos frigoríficos dez mil animais por ano, com idade méida de 18 meses.

Além da genética, para melhorar e animais por hectare o rendimento de carcaça de bovinos é fundamental apostar na dieta desses animais. Num passado recente, quando um boi atingia 500 quilos, era considerado um animal gordo. Hoje, nem sempre um boi com esse peso está pronto para o abate. Uma carcaça é composta principalmente de músculos, ossos e gordura. A proporção entre os três componentes varia de acordo com idade, peso, raça, aptidão genética e dieta, mas um bovino está bem acabado e pronto para o abate quando apresentar gordura de cobertura acima de três milímetros. É ela a porção mais variável e também a que maior influência exerce sobre o rendimento.

Na engorda no pasto, há duas formas de os pecuaristas melhorarem o rendimento de carcaça de seus plantéis, segundo o zootecnista Danilo Grandini, da Phibro Saúde Animal, uma das principais empresas que atuam no País na área de aditivos alimentares medicamentosos. Uma delas é suplementar os animais durante a recria. Nesse período, entre a desmama e o início da fase final de engorda, a suplementação da dieta permite a produção de uma arroba mais barata, uma vez que a base da dieta continua sendo o pasto. “É mais fácil um garrote de 250 quilos ganhar peso do que um boi de 400 quilos”, afirma Grandini. A segunda opção é caprichar na suplementação durante a terminação da engorda, quando o animal está prestes a ir para o frigorífico. “Nessa fase, o pecuarista terá de subir consideravelmente o nível de suplementação, oferecendo uma ração que corresponda a 2% do peso vivo do animal”, diz Grandini. O objetivo é conseguir os mesmos benefícios de um confinamento convencional, mas a opcão por um caminho ou outro dependerá essencialmente da disponibilidade de pastos na fazenda.

Para o pesquisador Flávio Dutra de Rezende, da Agência Paulista de Tecnologia de Agronegócios (Apta), de Colina (SP), órgão da Secretaria de Agricultura do Estado, num sistema de engorda, o que interessa é conhecer a quantidade de carcaça produzida, e não somente o ganho de peso corporal. Um estudo conduzido na Apta ilustra bem esse raciocínio. Comparou-se a terminação de animais nelore, não castrados, com peso inicial de 480 quilos, recebendo duas quantidades de suplementação alimentar, equivalentes a 0,5% de seu peso vivo e outra de 2% sobre o peso vivo. O experimento durou 89 dias, simulando o chamado confinamento no piquete. Como era esperado, os animais que receberam mais suplemento ganharam mais peso, ou seja, 1,5 quilo por dia ante 0,5 quilo por dia dos demais. Mas o que chamou a atenção do pesquisador foi o ganho proporcionado pelo rendimento de carcaça. Em vez de 50% de rendimento, os animais abatidos atingiram 58,7%. Foram 5,1 arrobas de carne a mais com a suplementação de 2%. Além disso, houve uma melhora no acabamento das carcaças. “Nos animais que tiveram aporte maior de suplementação, a espessura de gordura foi de 3,6 milímetros”, diz Rezende. “É esse acabamento mediano de gordura na carcaça que atende as exigências mínimas dos frigoríficos.”