A ciência não tira os holofotes dos OGMs, sigla para organismos geneticamente modificados. Produzir ou não espécies transgênicas em escala industrial continua a ser um tema polêmico, aqui e lá fora. Não há consenso sobre quais seriam as vantagens da introdução de um gene diferente em uma determinada espécie. No Brasil, há 28 variedades de culturas transgênicas, tolerantes a herbicidas e resistentes a insetos, liberadas para o plantio pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. São 15 variedades de milho, oito de algodão e cinco de soja, plantadas em 25,4 milhões de hectares em 2010.

Atualmente, há várias culturas sendo pesquisadas, entre elas o arroz, o feijão e a cana-de-açúcar. A mais recente descoberta veio desse grupo. Em junho, a Embrapa Agroenergia, em Brasília, apresentou as primeiras mudas de cana-de-açúcar resistentes à seca. Elas são frutos de uma pesquisa que, desde 2008, já consumiu investimentos de R$ 4 milhões. “O encerramento da primeira etapa da pesquisa foi como esperávamos”, diz Hugo Molinari, pesquisador da Embrapa e um dos responsáveis pela obtenção das novas mudas de cana transgênica. “A variedade tem potencial para resistir à seca.”

Em períodos de estiagem, as perdas de produção nas lavouras de cana-de-açúcar podem variar de 10% a 50%, a depender da época do plantio e da região de cultivo. A produtividade média no Brasil é de 67 toneladas por hectare. A média paulista é a maior. São 78 toneladas de cana por hectare, com unidades produtoras na faixa de 95 toneladas. “A variedade poderá ajudar os produtores em regiões de déficit hídrico”, diz Molinari. Mas, segundo o pesquisador, há limites e não milagre: a cana resistente não se comportará como um camelo que guarda água nos colmos.

Resultado: para o desenvolvimento das plantas OGM de cana-de-açúcar, a Embrapa desembolsou R$ 4 milhões. As mudas se mostraram resistentes à seca

Até setembro, a cana-de-açúcar transgênica será multiplicada in vitro, nos laboratórios da Embrapa. No entanto, essa multiplicação não mostrará o percentual de aumento de produtividade por hectare, em relação aos cultivares não transgênicos. “Somente em junho de 2012, quando a variedade for cultivada a campo, saberemos se esse potencial existe”, diz Molinari. De acordo com o pesquisador, a próxima etapa será prospectar recursos financeiros junto ao Japan International Research Center for Agricultural Sciences, empresa de pesquisa vinculada ao governo japonês e parceiro da Embrapa. Foram os japoneses que liberaram o pedaço identificado do DNA da cana-de-açúcar que a Embrapa vem testando. Em seguida, serão realizados os testes para avaliar o grau de biossegurança da cana transgênica. “Até a liberação comercial da variedade, o processo pode atingir R$ 100 milhões”, diz Molinari.

Em relação à segurança ambiental, serão analisados os riscos de que as plantas transgênicas passem adiante o gene modificado para outras plantas e organismos. Esse é um dos temores dos cientistas e uma das críticas dos ambientalistas contrários aos OGM. “Quando estiver no comércio, a variedade proporcionará mais competitividade ao etanol brasileiro”, diz Aloizio Borem, vicepresidente da CTNBio. Segundo Borem, a previsão é de três anos para que a variedade chegue ao mercado.

Molinari, da Embrapa, é mais cético. Ele acredita que o período pode se estender para até oito anos, por ainda depender de apoio financeiro e de área credenciada para os testes de campo da cultivar. De acordo com um levantamento da consultoria Céleres Ambiental e da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem), o Brasil pode economizar com a redução no uso de insumos cerca de R$ 80 bilhões, nos próximos dez anos, com cultivo de transgênicos. “Atualmente, não existe variedade comercial de cana-de-açúcar OGM no mundo”, diz Molinari. Mas já existe um concorrente à vista. Em março, após 12 anos de trabalho, pesquisadores da Indonésia anunciaram uma variedade de cana que também é resistente à seca. No mundo, 29 países cultivam plantas geneticamente modificadas, em 148 milhões de hectares. Os americanos são os que mais utilizam transgênicos, segundo dados do Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações Agrobiotecnológicas (Isaaa). Os agricultores do país respondem por 66,8 milhões de hectares, 54,8% do total da área mundial ocupada com OGM.

Os transgênicos no Brasil e no Mundo

Soja 17,8 milhões de hectares (75% do total plantado com soja)

Milho 7,3 milhões de hectares (55% do total plantado com milho)

Algodão 0,25 milhão de hectares (26% do total plantado com algodão)

Total de hectares cultivados 148 milhões em 2010 (avanço de 10%, em relação a 2009)

Culturas geneticamente modificadas foram plantadas por 15,4 milhões de agricultores, em 29 países