Ser fazendeiro nos Estados Unidos é mais lucrativo do que nunca. Em meio à disparada dos preços de commodities agrícolas, a saída para o campo parece uma boa alternativa em meio à crise econômica que assola a maior economia do mundo. O lendário Jim Rogers, que já foi parceiro do megainvestirdor George Soros no fundo Quantum, recomenda que os jovens americanos virem fazendeiros e não banqueiros, se quiserem ficar ricos. Para o milionário Rogers, a riqueza está nas colheitadeiras e não nos escritórios dos engravatados em Nova York.

Trata-se de uma mudança e tanto. Há muitas décadas, os fazendeiros americanos vinham sendo considerados uma espécie em extinção, com o crescimento dos setores de serviços, tecnologia e bancário. Para evitar seus prejuízos, foram criadas transferências governamentais e, em diversos setores, medidas protecionistas. Mas a alta de preços de commodities está mudando essa tendência, elevando a renda no campo e os preços de terras. Enquanto o PIB americano se arrasta a uma taxa de crescimento de apenas 1,9%, a renda agrícola cresceu 27% no último ano. A bonança no campo chama a atenção, e os índices de desemprego são muito mais baixos nos Estados de produção agrícola do que a média nacional. A taxa de desemprego em Nebraska, por exemplo, é de apenas 4,1%, a segunda menor do país, muito abaixo da média nacional de 9,1%, ou de taxas mais altas como os 11,7% do Estado da Califórnia. Os dados mais recentes do Departamento de Agricultura americano, de 2007, mostram que o número de fazendas já vinha aumentando na última década, de 2,1 milhões em 2002 para 2,2 milhões naquele ano. Desde então, a tendência parece ter se acentuado. Fazendeiros que haviam perdido suas terras durante crises anteriores agora festejam a alta rentabilidade da atividade. Um dos exemplos é Ken Woitaszewski, fazendeiro em Wood River, Nebraska, que chegou a quase perder as terras herdadas do pai para o banco, em 1985. De um total de 200 hectares, ele e seus três irmãos conseguiram salvar 65 hectares, contou o fazendeiro à revista Time. Nos tempos duros, os três tinham empregos em outras fazendas ou em atividades não relacionadas ao negócio, em troca de salário. A fazenda era gerida da maneira mais barata possível. Desde a década de 90, Woitaszewski começou a se recuperar. Aprendeu que não deveria ter dívidas e com os lucros conseguiu começar a recomprar terras de outros fazendeiros em dificuldades, primeiro em pequenas porções. Foram 60 hectares na década de 1990. Nos últimos anos, a alta de preços de commodities permitiu que a família comprasse nada menos que 2.400 hectares. O valor da terra hoje é de US$ 24 milhões e seus lucros podem chegar a algo como US$ 6 milhões. A prosperidade espalha-se pelos principais Estados agrícolas do país, provocando inveja nas áreas urbanas.

 

 

A estrela da recuperação do campo americano é o milho, cujas cotações dispararam nos últimos anos com a maior demanda internacional por proteína e, principalmente, com a produção de etanol no país. Embora os preços já tenham subido expressivamente, ainda há espaço para alta, acredita o analista Matt Roney, do Earth Policy Institute. “Ainda não chegamos aos recordes de preços atingidos na safra de 2007/2008”, afirma. O instituto acredita que novos recordes podem ser atingidos nos próximos anos.

 

 

“Potencial de geração de empregos é pequeno pelo capital exigido”

Kimberly Ann elliott, do Peterson Institute of International Economics

 

Embora as histórias de riqueza nas regiões agrícolas sejam impressionantes, o peso da agricultura na economia americana é pequeno demais para que a ida para o campo seja vista como uma real alternativa aos níveis de desemprego no país. A participação do setor no PIB é de apenas 1%, e, mesmo incluindo outras áreas da economia ligadas à agricultura, como fertilizantes, sementes ou tratores, que constituem parte importante do chamado agronegócio, a participação não chega a 4%. Enquanto isso, o setor de serviços tem nada menos que 70% da economia. A especialista Kimberly Ann Elliott, do Peterson Institute for International Economics, diz que o campo dificilmente vai gerar um número relevante de empregos em nível nacional. “Além disso, a migração para o campo não é tão simples, é necessário capital para compra de terras”, afirma Kimberly Ann. E conseguir esse capital ficou mais difícil nos últimos anos, com a disparada dos preços das terras acompanhando a alta das commodities.

As altas de preços, que tornam as terras um dos melhores investimentos nos últimos anos, vem atraindo investidores de fora do campo. Os resultados compensam: em algumas áreas de produção de milho e trigo nos Estados Unidos, os preços subiram mais que 20% em um ano (ver mapa na página 31) . Nos últimos cinco anos, há regiões americanas com altas de 70%, como fica claro na história de Woitaszewski. Investidores tradicionais em terras, como o Hancock Agricultural Investment Group, já notam concorrência de investidores recentes, como bancos e fundos de investimento americanos.

A alta das cotações das terras provoca uma discussão sobre a existência de uma eventual bolha de preços. “Estamos vendo especulação de fundos de investimento e fundos de pensão e os preços de terras estão subindo de maneira irrealista”, afirma Dale Wiehoff, diretor do Institute for Agriculture and Trade Policy, em Minneapolis. Wiehoff teme que a entrada de dinheiro oriundo do mercado financeiro esteja elevando os preços de terras a níveis insustentáveis e que isso provoque um “crash” de preços, mais à frente. A alta de preços de terras já provoca preocupações no Federal Reserve de Kansas, que num relatório recente afirma que o total de empréstimos tomados com base em terras vem crescendo substancialmente, e que a inadimplência poderá aumentar. Mas essa opinião não é generalizada. Conceituados economistas agrícolas acreditam que a escalada de preços é sustentada por fundamentos econômicos, como a maior demanda por commodities agrícolas em todo mundo, e que a tendência de alta não vai se esgotar a curto prazo, sustentando a alta de preços.

 

 

 

No Brasil, a alta de preços é sustentável nas áreas de fronteira

donald stuart, da Consultoria Agrifrontiers

 

No Brasil, os preços de commodities também estão reforçando a renda, mas com a economia aquecida, a comparação não é tão brilhante. No primeiro trimestre do ano, o PIB agropecuário cresceu 3,1%, em relação ao mesmo período de 2010, porém, abaixo dos 4,2% registrado de janeiro a março de 2009. Mas a euforia em torno da terra é a mesma: os preços subiram mais do que em algumas regiões americanas. Donald Stuart, da consultoria Agrifrontiers, especializada na venda de terras no Brasil, diz que a alta não é sustentável nas regiões mais maduras do País, mas deve continuar nas de novas fronteiras agrícolas.