Os pecuaristas que se dedicam ao melhoramento animal de raças bovinas têm nas mãos um mercado potencial de cerca de R$ 2 bilhões por ano. Trata-se do comércio de touros, um segmento da cadeia bovina em ascensão, mas ainda pouco explorado de forma organizada. Aquela quantia é o que deveria ser desembolsado pelas fazendas de gado de corte, que precisam criar bezerros mais pesados e mais precoces, para que ganhem escala na produção. São os touros superiores que geram bezerros que irão engordar mais rapidamente do que nos habituais 30 a 36 meses de vida, comumente necessários para irem ao abate. “Touros velhos devem ser trocados, mas a maioria dos pecuaristas não faz isso”, diz o criador Luciano Borges, do Rancho da Matinha, em Uberaba (MG). Há dois problemas nessa equação, segundo Borges. O primeiro é a baixa disponibilidade de touros melhoradores e avaliados em programas de seleção genética. O segundo problema é cultural. “Mesmo que houvesse animais em quantidade suficiente, a maioria dos produtores deixa as compras de touros em terceiro, quarto, quinto planos”, diz.

Borges mantém um trabalho respeitado de criação de touros, disputadíssimos em seu leilão anual. Em 2010, o leilão Rancho da Matinha obteve a maior média de preços no País, de R$ 13.446 para os 128 touros, entre todos os leilões que venderam acima de 100 animais, segundo dados da leiloeira Programa, de Londrina (PR).

Os geneticistas aconselham que todos os anos 20% dos touros sejam retirados dos pastos e substituídos por novos animais. Assim, a cada cinco anos haveria uma troca completa da genética utilizada em uma determinada fazenda de gado. Como os touros começam a cobrir vacas entre os dois e os três anos de idade, se aposentariam cinco anos depois. “Não é isso que vemos no campo”, diz Ricardo César Passos, diretor da Cria Fértil, empresa especializada em inseminação artificial, de Goiânia (GO). “Tem muita gente que utiliza touros até os 12 anos, já pouco férteis.” Segundo ele, é comum ver touros emprenhando suas próprias filhas, o que pode baixar a produtividade do rebanho, que passa a ter menos nascimentos por safra, por problemas de consanguinidade.

Envelhecido, o atual plantel de touros em atividade no País é estimado em 2,2 milhões de animais. Eles cobrem, todos os anos, cerca de 72 milhões de fêmeas em idade reprodutiva, segundo dados da consultoria Informa Economics FNP, de São Paulo. Assim, na conta dos 20% de troca anual, a quantidade recomendada de substituição é de 440 mil animais. Como a média de preço foi de R$ 5 mil, em 2010, está aí o mercado potencial acima de R$ 2 bilhões. “Acredito que não temos condições de trocar nem a metade do que o País precisa”, diz Borges. Ainda, segundo o criador, caso sejam contados apenas os touros melhorados em programas de seleção, a quantidade é ainda menor. “Talvez, nem chegue a 10% da necessidade do rebanho”. Borges, no entanto, não fica apenas na avaliação pessimista. Ao contrário, ele vê nesse déficit crônico uma oportunidade de negócio. Não há no País um levantamento oficial de quantos machos são avaliados nos programas de seleção genética. Mas, entre as empresas do setor, é corrente a percepção de que quase todos esses animais são vendidos em leilões. “A demanda por touros só faz crescer nos últimos anos”, diz Maurício Tonhá, diretor da leiloeira Estância Bahia, de Água Boa (MT). Para ele, quanto mais o mercado sinaliza que há aumento da demanda por carne, mais se investe em touros.

Confiança no futuro:

para Paulo Horto, da leiloeira Programa, as empresas do setor poderiam colocar pelo menos 100 mil animais, a cada ano, à venda nos leilões. Hoje, muitos reprodutores passam do momento ideal de serem substituídos nos rebanhos de raças de corte

Déficit crônico:

o criador Borges diz que não há touros suficientes

 

 

 

 

Não por acaso, as leiloeiras estão alertas quanto ao que ocorre em todo o segmento: está para começar, em setembro, a temporada mais quente de venda de touros em leilões. Essa temporada vai até o final de novembro. Segundo Lourenço Miguel Campo, da Central de Leilões, de Araçatuba (SP), 60% das vendas de touros acontecem nos leilões do bimestre setembrooutubro. O motivo dessa concentração é que, a partir de dezembro, começam as estações de monta que duram cerca de quatro meses, um período em que as fazendas juntam touros e fêmeas para que todos os bezerros nasçam na mesma época. Ou seja, as montas prédefinidas organizam a produção.“Neste ano, deveremos ter um crescimento de 50% sobre os 10 mil touros vendidos em 2010”, diz Paulo Horto, diretor da Programa Leilões. Segundo Horto, as empresas leiloeiras poderiam comercializar pelo menos 100 mil touros por ano. “É menos de um quarto daquilo que o País necessita”, diz Horto.

Carlos Guaritá Marques, da leiloeira Leiloboi, de Campo Grande (MS), uma das empresas que mais realiza remates de touros no primeiro semestre, acredita que o mercado já sinalizou aumento das vendas em relação ao ano passado. A razão: o preço do bezerro continua firme e sem expectativa de baixa. “Quem consegue vender bezerro de 260 quilos, paga por ele até R$ 900”, diz. Essa cotação significa uma valorização de 50%, em relação à média de preços dos bezerros mais leves, vendidos a R$ 600. Para Marques, o criador somente reconhece que pode pagar por um touro bom quando ele ganha mais no momento de vender sua safra. No primeiro semestre deste ano, a Leiloboi intermediou a venda de 2.260 touros, por R$ 15,4 milhões.

CENÁRIO DO REBANHO NO PAÍS

2,2 milhões é o plantel de touros

72 milhões é o plantel de fêmeas em idade reprodutiva

440 mil reprodutores deveriam ser substituídos, por ano

3 bois gordos de 18 arrobas, por um touro são o pradrão da relação de troca